Black Metal, por onde começar?

No início da década de 1980 algumas bandas de Speed e Thrash Metal começaram a modificar um pouco seu som, fazendo algo mais agressivo, tanto instrumentalmente quanto liricamente. Inspiradas diretamente por Mötorhead e Black Sabbath, essas bandas versavam sobre assuntos chocantes, como viagens ao inferno, críticas religiosas e o Apocalipse.

Black Sabbath: inspiradores de várias vertentes do metal.

Em 1982, o Venom lançou o álbum Black Metal, que deu origem ao nome do estilo que estava em processo de construção, um gênero que abusava de instrumentais rápidos, tremolos, blast beats, vocais rasgados e, pelo menos no início, contava com gravações caseiras bastante prejudicadas pela baixa qualidade.

A partir dos anos 1990 o estilo teve sua expansão. Novas bandas que estavam surgindo começaram a incrementar o som, diferenciando bem a sonoridade da década anterior. Assim começaram a surgir os mais variados subgêneros do Black Metal.
Essa década ficou marcada pela ação de músicos extremistas da cena norueguesa. Membros do Mayhem, Darkthrone, Emperor e Burzum formaram o Inner Circle, grupo que participou da ampliação da cena, assim como dos ataques à instituições religiosas. Aqui a temática tornou-se mais valorizada e abrangia temas ocultos em geral, como satanismo, paganismo, ocultismo e anticristianismo.

Cabeças de porco empaladas, típicas dos shows do Mayhem.

Ainda na década de 1990, a sonoridade de várias bandas se afastou do que era conhecido como Black Metal, mas ainda possuíam a mesma natureza. As maiores diferenças foram a adição de teclados compondo a base melódica das músicas, era o surgimento do Symphonic Black Metal e do Melodic Black Metal.

O primeiro ficou mais conhecido pelas trilhas de teclado que davam uma ambientação totalmente diferente ao som. Porém, mais do que isso, o Sympho é caracterizado por introduzir técnicas de música erudita nas composições, muitas vezes aumentando seu peso. Em sua primeira década de existência as bandas que mais tiveram destaque foram o Anorexia Nervosa e o Dimmu Borgir.

Já sua faceta melódica mostra uma tendência a quebrar o espírito de revolta do gênero e isso é evidenciado nas mudanças sonoras: as guitarras possuem uma afinação mais grave, com riffs marcantes, os vocais geralmente são menos sujos ou executados com técnicas mais refinadas, tornando as músicas mais leves, no conjunto. Com o nascimento desses subgêneros e o avanço dos anos, as gravações melhoraram, boa parte das bandas saíram do underground e a imagem do Black Metal como um estilo bruto e sujo começa a ser alterada. Bandas como o Ancient e o Black Omen são grandes representantes da raiz melódica.

Ancient

Afastando-se mais dos holofotes da mídia especializada, era possível observar o surgimento de bandas com uma sonoridade mais atmosférica, um instrumental mais lento, com timbres bastante característicos das guitarras e com vocais bem diferenciados. Ali surgia o Ambient Black Metal, também conhecido como Atmospheric Black Metal. A influência de Dark Ambient foi seu pilar sustentador, incorporando as vozes sussurradas, distorções e barulhos gravados ao ar livre, evidenciando um som mais intimista, envolvente e recheado de sintetizadores e teclados. Os discos do Burzum feitos durante o período prisional de Varg Vikernes são um belo exemplo dessa sonoridade, assim como os álbuns do Forteresse.

Nessa mesma onda os EUA tiveram seu "boom", o tão falado USBM, que gerou grupos como o Absu e Judas Iscariot.

Tara, disco que é considerado a obra-prima do Absu.

Em meio a tantas ondas criativas, algumas bandas inovaram ainda mais o estilo e passaram despercebidas durante um tempo. Com o metal negro se desenrolando com grande força fora da Europa, o Silencer foi criado em 1995 e praticamente ignorado pelos ouvintes da época. Fazendo um som mais arrastado, com influência direta de Funeral Doom, vocais agonizantes, guinchados, ao invés dos tradicionais urros, e uma temática de suicídio, a banda é considerada a precursora do Depressive Black Metal (na época nomeado de Depressive Suicidal Black Metal). Hoje em dia a vertente é ligeiramente diferente, já que absorveu influências melódicas e técnicas ao longo do tempo, como uso de repetições nos instrumentos de corda, algo quase como o drone, maior variação vocal e bateria melhor definida. Geralmente o tema permanece o mesmo para o estilo: suicídio, mas há desde grupos falando de dor e sofrimento até músicos com algum tipo de engajamento social. Dråpsnatt e Thy Light são bandas nascidas do legado noventista.

Nattramn, membro icônico do Silencer, sem e com sua maquiagem.

Outro exemplo de como o gênero mudou surge em bandas evidenciadas nos anos pós-2000. Bateria extremamente rápida, doses a mais de técnica e muita brutalidade, vocais mais graves e uma ambientação violentíssima, esse é o Brutal Black Metal, ou War Metal, como ficou mais conhecido. Weeping Birth e Burial Mound são bandas que seguem essa premissa e provocam uma destruição sonora poucas vezes vista.

Enquanto alguns músicos buscavam explorar o Black Metal até onde parecia possível, outros contentaram-se em uni-lo com outros estilos já conhecidos. As possibilidades aqui são muitas, então vamos falar do lado mais controverso do metal negro, o NSBM. Também conhecido como RACBM ou ZBM, as siglas designam National Socialist, Rock Against Communism e Zionist, evidenciando temáticas conflitantes. O que realmente define o som é a inserção de elementos de Hardcore, como as bases e riffs de guitarra, a agressividade "de rua" e um som mais sujo, diferente daquela gravação porca dos anos 1980. Blutkult é um grande nome para a cena, que peca em abraçar bandas com sonoridades distintas sob a mesma temática de ódio, seja ele nazi, vermelho ou religioso.

Com a evolução do estilo, os músicos não pararam de inovar e começaram a agregar elementos de outros gêneros, dentro e fora do metal, ao BM. Há um sem número de opções e combinações a serem feitas, mas algumas recebem destaque. Juntando Black e Doom, por exemplo, temos um som arrastado, pesado, variando entre o agressivo e o sombrio, com variações bruscas de tempo e presença de vocais predominantemente graves. Cantas ad Mortuos é uma banda cearense que exibe essa ótima combinação em suas duas demos.

No final da década de 2000 houve um boom de bandas que faziam "Blackgaze", uma mistura de Black Metal e Shoegaze, mas que mostravam ao mesmo tempo influências progressivas, Folk e de diversos outros ritmos que não podiam ser considerados como uma unidade dentro das músicas, esses grupos levaram o Post-Black Metal ao mundo de uma forma não imaginada, capturando cada vez mais fãs e nos mostrando o que mais poderíamos esperar do saudoso Black Metal. A tríade Alcest, Amesoeurs e Lantlôs são considerados os pilares do gênero, apesar de modificarem bastante o som nos registros mais recentes.

Neige, tido como o gênio criador do Post-Black Metal.

Em paralelo temos outros músicos que também se utilizam das mais variadas influências, mas as composições tem uma moldura diferente, onde é possível analisar e ouvir cada elemento independentemente dos outros, é esse o Avant-Garde/Black Metal, feito pelo Menace Ruine.

Por fim, uma bela mescla de estilos que tem ganhado ênfase nos últimos anos, BM e Dark Ambient, sem soar como Ambient Black Metal. As músicas são, quase sempre, de uma atmosfera profunda, tocadas num volume baixo e recheadas de elementos não musicais, como sinos, sons de vento, água corrente e o que mais houver de aproveitável para os músicos. Teclados e sintetizadores são usados em profusão, com a intenção de atingir um nível extremo de intimismo e liberdade musicais. Grupos como o Xanctux e Thisquietarmy são nomes que garantem uma viagem por cenários obscuros e cruéis.

Eric Quach, a mente por trás do Thisquietarmy.

Como já dito anteriormente, o número de possíveis misturas aqui é bastante grande, sendo que os elementos principais geralmente serão os de destaque nos gêneros utilizados. Portanto, a matéria se encerra sem entrar no projeto megalômano de tentar dissertar sobre cada opção presente no cenário musical atual.
A ideia inicial era a de indicar os elementos sonoros e bandas representativas em diversas facetas do metal negro, abrindo uma via de acesso mais fácil para novos fãs e apresentando um pouco mais do estilo para os saudosistas.

É importante ressaltar que não há a intenção de regrar o estilo ou padronizar nenhuma experiência sonora, as opiniões contidas no texto são fruto da experiência e liberdade que o autor toma para falar do assunto.

Por Alexandre Romansine
Black Metal, por onde começar? Black Metal, por onde começar? Reviewed by Alexandre on 22:00 Rating: 5

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